Jornal Mensagem – Coluna Piquetes 21/01/1959
Joaquim Dias Drummond
Como dissemos em nossa última crônica:
à diplomacia do Zé Lolô ficamos a dever o que o que os nossos reiterados
esforços não conseguiram alcançar. Ele era secretário do Agente Executivo
Municipal e isto lhe dava uma parcela de autoridade.
O Teatro passou a ser um bem
comum dos dois grupos dramáticos que porfiavam em proporcionar a Sete Lagoas
bons espetáculos.
As recitas se sucediam
alternadamente e pouco a pouco foi engrossando de cada lado, o número de
torcedores. A rivalidade era grande e os choques de opiniões criavam clima
propicio para discussões acaloradas. Os componentes de um grupo, para
assistirem aos espetáculos do outro disputavam as primeiras filas de cadeiras,
e de lápis em punho, anotavam as gafes que ocorriam durante as representações para
depois comentá-las com sarcasmo.
A crítica era severa e aos rivais
não se perdoava o menor deslize. Isto porem, longe de levar o desanimo as
hostes adversarias, constituía um estimulo de reciproco proveito.
O teatro evoluía. Os ensaios constituíam
verdadeiras aulas práticas de dicção, de atitude, de gestos. Boa escola,
indiscutivelmente. Alguns amadores já se compraziam em imitar autênticos atores,
raspando os bigodes e deixando crescer fartas cabeleiras, esmeradamente
tratadas. Contudo, faltava-nos alguma coisa.
No futebol, jamais poderá haver
progresso de técnica, se o time não tiver um treinador competente. No teatro de
amadores sucedia o mesmo. Um ensaiador hábil era, por isto mesmo, disputado a
bom preço. Isto compreendeu logo o grupo “Melanciense” que conseguiu por intermédio
de um amigo de Santa Luzia, o concurso do velho e grande ator português Antônio
Palhares.
A nova rebentou como uma bomba de
retenção, no campo de nossos adversários. Subestimavam o valor de tal
cooperação. A ator Palhares, diziam, era demasiado velho e certamente “não
daria no couro”. Queriam ver o que de novo poderíamos apresentar.
Surdos a tais clamores,
ensaiamos, discretamente, peças de grandes montagens, como “Os Milagres de Santo
Antônio”, “José do Telhado” e “Gaspar, o Serralheiro”, delas participando com
retumbante sucesso, o grande ator Palhares. Seria desnecessário acrescentar
que, a essa altura dos acontecimentos, a rivalidade atingiria seu ponto máximo.
Previmos desde logo, que a reação não se faria por esperar.
O Grupo “João Caetano” iniciou os
ensaios do notável drama “O Poder do Ouro”. A propaganda foi feita em grande
estilo. O Teatro superlotou. Plateia, literalmente cheia, camarotes e
torrinhas, apinhados. Nós do “Melanciense”, lá estávamos, nas primeiras filas.
Grandes e pequenos acorreram ao Teatro. Autentica noite de gala. A ansiedade
aumentava de momento em momento.
Executada a sinfonia que precedia
os grandes espetáculos, o pano de boca foi levantado, lentamente. Naquela época
ainda não se usavam as cortinas, de fácil manejo. O nosso pano, para se manter
bem estendido, tinha guarnecido, na parte inferior, um cano de ferro de uma
polegada.
Pesava, de fato. Na peça, o João
Andrade representava o papel de ferrenho adversário do Galdino Moura,
interpretando outro personagem. Odiavam-se, mutuamente. O encontro entre ambos
seria fatal, e realmente foi. Após acirrada troca de desaforos, o João fuzilou
o Galdino, a queima-roupa. Queda bem ensaiada. O Galdino cambaleia, avança, retrocede
e cai estatelado no tablado. Estava morto! A plateia aplaude delirantemente os
amadores e o pano desce como um raio. Galdino, que “morrera” de costa, percebe
a iminência do perigo e levanta-se, de um salto. É que, ao cair fizera-o sem
pensar na posição do cano de ferro. Este particular não fora previsto, os
ensaios prolongados.
Uma gargalhada estrepitosa, pôs
fim ao grande espetáculo. O morto ressuscitara! ...
E o “Melanciense”? Bem, o nosso
dia também chegaria...
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